terça-feira, 7 de setembro de 2010

Teofania

Numa tarde de quarta-feira  em Agosto  fui ao consultório de um cardiologista submeter-me a um eletrocardiograma. Depois de alguns minutos de espera no rol de entrada, a secretária do médico pediu que a acompanhasse para uma das salas onde ela imediatamente tomou as providências do exame, colocando os fios e sensores em mim. Terminado o procedimento, novamente no rol eu aguardava pelo laudo do médico que sairia em seguida. Nesse tempo de espera um  fato inesperado aconteceu. Um senhor que se despedia de um amigo, ao dirigir-se para a porta de saída do consultório, deteve-se por um momento, virou-se para mim, olhou-me, apertou-me a mão com gentileza, com a outra afagou meu braço esquerdo e com ternura abaixou a cabeça em sinal de despedida. O gesto daquele desconhecido teve em mim a duração da eternidade e um universo de intensidade que não sou capaz de descrever. Logo que ele saiu, senti saudade.

Antes que alguém conclua precipidamente, digo que não!, não estou em crise de carência afetiva. Sou muito amado por meus pais, minha esposa, meus parentes, por vários de meus irmãos da igreja que frequento e de outras igrejas, e estimado por amigos que já declararam-me sua afeição. Sou carente sim, do afeto, do desejo, do cuidado e da estima daqueles que me são preciosos e preciosas, mas não estou em crise. Pode parecer que supervalorizei o gesto do homem, mas realmente surpreendeu-me e fiquei totalmente desarmado.

Não pude deixar de fazer conexão do evento com o experimentar Deus como o totalmente Outro que sempre me surpreende. Na realidade, o gesto daquele desconhecido fez-me perceber com mais clareza que existem atitudes afetuosas, olhares, afagos e acolhidas que só posso receber Daquele que não consigo prender no tempo e no espaço das minhas necessidades. Não posso prendê-lo nem apreendê-lo inteiramente, portanto, sinto que será sempre um Desconhecido. Esse Desconhecido me alegrará por toda a vida, como aquele amigo de infância que brinca de se esconder pra depois nos surpreender com a revelação de que esteve o tempo todo ali, pertinho. Assim, vejo-me liberto da tentantiva frustante de buscar conhecê-lo inesgotável e indubitavelmente através de conceitos, sistemas, caminhos, sensações... porque tudo isso faz-me lembrar que O conheço um pouco. Mas, creio que enquanto aguardo a redenção total, Ele me será sempre aquele velho Desconhecido.

Igor Pires do Nascimento

Um comentário:

Henrique Rodrigues Soares disse...

Caro, Irmão Igor, na verdade o que as nossas pobres ciências tentam nos explicar sobre Deus, é tão infimo diante de sua grandeza, principalmente se falamos de sua presença sem igual.

Mas um dia estaremos lá, e me coloco na fila para ser bibliotecário do céu, porque há tanto para aprendermos sobre ele e a cração.

Abraços!