quarta-feira, 4 de fevereiro de 2009

Tragédia na igreja: juízo de Deus?


Vale a pena ler a obra do historiador espanhol César Vidal sobre o médico e filósofo medieval Moisés Ben Maimônides. “Maimônides, o médico de Sefarad” é uma ficção sobre os principais acontecimentos da vida de um dos mais influentes pensadores judeus, que viveu na Espanha no século 12. Para se ter uma idéia da influência desse filósofo entre os judeus, basta saber que é comum entre eles o dito: “De Moisés a Moisés, nunca houve ninguém como Moisés”.

Por meio da obra de Vidal é possível descobrir que a agudeza de raciocínio do grande pensador medieval era precoce. Isso não o impedia, porém, de passar pela fase em que procuramos reduzir todas as questões da vida aos nossos esquemas simplistas. Ao deparar com a morte de um jovem brilhante da comunidade judaica de Córdoba, onde ele vivia, selou sua convicção a respeito das tragédias que desabam sobre a vida das pessoas: os justos prosperam enquanto praticam a justiça e os maus recebem por meio do sofrimento a justa punição dos seus pecados e ponto final. Ele não sabia de nada de errado na vida daquele jovem, mas se ele foi vítima de uma tragédia é porque algo havia feito de errado.

A vida acaba por ensinar a Maimônides que existem muito mais coisas entre o céu e a terra do que imaginava a sua vã teologia. Porém, o exemplo é importante para que lembremos, todos nós, a tendência irresistível que temos de querer dar explicação a tudo, especialmente quando deparamos com tragédias que atingem a igreja.

Os amigos de Jó não resistiram a essa tentação, como sabemos. Diante daquela tragédia, era improvável demais que Jó fosse justo. Por conta disso, derramaram sobre ele o pacote teológico adotado por Maimônides na sua adolescência: "Você sofre porque pecou. Perdeu os filhos, os bens, a honra etc, porque Deus está lhe punindo pelos seus pecados".

É certo que as pessoas, crentes ou não, sofrem. Mas nem sempre sabemos por quê. E ao invés de querer explicar tudo com versículos recheados de uma santa crueldade, devemos aprender a dizer “não sei”. E lembrar o conselho de Jó a seus acusadores: “Ao amigo deve o homem mostrar compaixão, ainda que tenha deixado o temor do Todo-Poderoso”.

João Heliofar de Jesus Villar, 45, é procurador regional da República da 4ª Região (no Rio Grande do Sul) e cristão evangélico.


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